"Ao fim das crônicas conheça os poemas do autor"

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sexta-feira, 24 de abril de 2015

MEU BRASIL BRASILEIRO

            Dia 21 de abril de 2015,
        Aniversário do sacrifício de Tiradentes pela Pátria

        Difícil ser brasileiro neste momento. Difícil, mas ao mesmo tempo instigante e fascinante. Lembro-me de um tempo parecido com o de hoje: quando eu, jovem, no Rio, comia no restaurante Calabouço, frequentava curso pré-vestibular de Medicina, fazia parte da AGEP (Associação Guanabarina de Estudantes Potiguares) e me empolgava com pronunciamentos de líderes estudantis que frequentavam o restaurante – Dirceu Regis, Elinor Brito, Vladimir Palmeira, por exemplo. Naquele tempo, a gente lutava de peito aberto contra a força de uma ditadura instalada no país, fosse no principal campo de batalha, a Avenida Rio Branco, nas ruas adjacentes, ou em torno do restaurante Calabouço, próximo ao Aeroporto Santos Dumont. Afinal, era aluno de um cursinho que não era barato, frequentado por jovens de várias classes sociais e de todo o país, e fazia refeições (bandejão) a preço simbólico no citado restaurante de estudantes. Tinha que lutar, pois, além das dificuldades financeiras, o que mais nos motivava e fervia nas veias, era a defesa de duas instituições sublimes: a Democracia e a Pátria. Na luta instalada, havia o momento do ataque e o momento do recuo, da dispersão. Esse era o momento em que, sozinho e pensando muitas vezes na família distante, procurava um bar ou uma lanchonete para, no banheiro, ajeitar a roupa, lavar o rosto, pentear o cabelo e, o mais importante, colocar a carteira do Calabouço dentro do sapato, para me salvaguardar, no caso de uma eventual “blitz”, muito comum após cada confronto. Era preciso me descaracterizar da figura de estudante militante, misturando-me com escriturários que desciam do trabalho, no final do expediente. Durante algum tempo, foi essa a minha rotina de estudante candidato a vaga numa Faculdade de Medicina, no Rio de janeiro nos distantes anos da década de 1960.
         Mas, a coisa ficou ainda mais difícil em 1968, com o advento do AI-5. Fecharam o restaurante “na marra”, acabando com o ponto de encontro dos estudantes que lá também faziam seus encontros para planejamentos e táticas contra os militares. Empolgação estudantil?... Sentimento pátrio? Como era possível, num combate tão desigual, enfrentarmos as possantes armas dos militares, apenas com as pedras portuguesas retiradas das calçadas? Não era de se estranhar que baixas estudantis acontecessem constantemente. Vi colega de braço quebrado; outro que, ao tentar devolver uma bomba de gás lacrimogêneo, a mesma explodiu na sua mão, causando a perda de três dedos; e, o que mais chocou a todos: a morte do estudante Edson Luis. O seu velório na Assembleia Legislativa foi clamoroso e varou a noite com inflamados discursos estudantis na escadaria do palácio. A “gigantesca” passeata dos 100 mil, que veio em seguida, contou com a participação de inúmeros artistas e intelectuais... Mas, a hora não era mais de se recompor diante de um roto espelho de bar ou de lanchonete do centro, após cada embate. Nem de buscar abrigo em escadaria de edifício, escalando o máximo de andares possíveis, achando guarida muitas vezes em escritórios retardatários, solidários com a nossa luta, até a situação serenar. Não. Não havia mais como continuar. Pelo menos para nós, simples secundaristas, comensais do Calabouço. O próprio Elinor Brito, presidente da FUEC, que liderava os estudantes no restaurante, foi quem, nos convocando para uma reunião geral, comunicou: “A coisa agora, vai ser diferente. A luta vai ser pra valer!” E, foi... Sem o respaldo de um diretório universitário, já que ainda não havia ainda alcançado a faculdade, ou sem apoio político, não dava para continuar: “abaixei as pedras”, dei meia volta, e busquei nos concursos outro rumo para a minha vida.
         A luta passou a ser mais intensa, com apoio de entidades estruturadas, com uso de armas e técnicas de guerrilhas urbanas, etc. Se era grande o número de estudantes e trabalhadores presos, por outro lado, técnicas especiais como sequestros de embaixadores passaram a ser executadas, forçando o governo a ceder. Eu agora observava tudo através dos jornais, rádios e TVs. A sensação não era a mesma, mas eu torcia pelos estudantes, é claro! Tempos depois, o jornalista Fernando Gabeira relataria, em detalhes fatos empolgantes da luta no seu livro “O que é isso, companheiro?” Da mesma forma que o cinema aproveitou momentos impactantes daquela grande aventura estudantil, transformando-os em filmes, como o belíssimo “Pra frente, Brasil!”
         Passados 50 anos, eis que nos deparamos hoje com uma situação esdrúxula de fome de poder bem parecida com a que acabei de narrar, que também acorda a juventude para a defesa da Nação. O país desgovernado, refém de um partido sem escrúpulos que age de qualquer maneira e quer, a qualquer custo, se perpetuar no poder. Um triste momento para a nossa Pátria Amada que se vê humilhada, diante do contexto mundial. Apesar do apoio maciço da população contra os erros do governo, infelizmente, membros do poder judiciário e do parlamento titubeiam na hora de tomar a decisão que o povo exige parecendo, de certa forma, concordar com os erros praticados pela cúpula do partido do governo. Nesse contexto, a garra da juventude brasileira entra novamente em cena, em defesa da Pátria.  E, eu, do alto dos meus 70 anos me emociono ao sentir a bravura com que eles atuam, em prol da nossa soberania, valendo-se atualmente, não mais das pedras portuguesas, mas de teclados de micros que também não são letais, mas alertam, denunciam, convocam e levam para a rua, não mais “cem mil”, como em 1968, mas milhões de brasileiros ávidos pela decência, pela seriedade, pela soberania de uma Pátria muito amada, acima de tudo; por um estado democrático, honrado, com oportunidades para todos; e por um povo alegre e fraterno que sempre foi a nossa marca entre as nações.      

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