"Ao fim das crônicas conheça os poemas do autor"

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domingo, 10 de maio de 2009

DO MEU SONHO DE BB

Vivi a minha a adolescência nos anos sessenta. Era muito comum entre os jovens de uma cidade pequena daquela época, freqüentar bailinhos ao som de Ray Conniff; “curtir” os Beattles, Nélson Gonçalves, Altemar Dutra; levar a namorada ao cinema, à sorveteria; e, iniciar-se em sexo na “casa da luz vermelha”... Na hora de escolher uma profissão, vinham logo à mente: Direito, Medicina, Engenharia, ou Banco do Brasil... Banco do Brasil? Com certeza! Era incrível o fascínio que ele exercia sobre os adolescentes da época.
O interesse era justificado. Além do ótimo salário que o banco oferecia, o seu funcionário gozava de uma série de vantagens: comissões diversas, complemento da aposentadoria, perfeita assistência médica e clube para lazer seu e da sua família, porque ninguém é de ferro... A fama dos membros do “Clube do Bolinha” (o banco até então só admitia homens!) era perfeitamente justificada. Principalmente nas cidades pequenas, onde os seus funcionários desfilavam uma discreta superioridade, provocando interesse entre mocinhas casadoiras e admiração e uma ponta de inveja entre os rapazes.
Mas, aqueles trabalhadores diferenciados que, um dia, enfrentando verdadeiros vestibulares para conseguir uma vaga no BB, eram apenas uns “sortudos” que acertaram na loteria? Negativo! Havia a outra face da moeda. A começar pelos lugares onde assumiriam e pelas constantes transferências, que os tornavam verdadeiros desbravadores a chegar nos pontos mais distantes do país, onde houvesse carência de funcionários. Da selva amazônica ao árido Nordeste, era por aí que se começava... E, havia rígidas regras de conduta. O funcionário tinha que andar sempre “na linha”. O menor deslize significava severa punição. Um regime quase militar! Horários rigorosamente controlados e serviços sempre supervisionados eram outras exigências da casa.
Nos meus livros “Em Família” e “Nativo”, está o poema “Acreditando cegamente”, que dedico a esses trabalhadores, pela sua bravura, pela aventura que era assumir o BB de então. Nele também está consignada a minha decepção pela casa a qual (ainda motivado pelo sonho de adolescente!) só tardiamente me acolheria, em 1980. O banco que me admitira, com relação ao funcionalismo havia mudado radicalmente, para atender às leis de organismos financeiros internacionais...
Do meu sonho de BB, restaram a certeza do dever cumprido, as grandes amizades, e a dor de ver uma instituição (que durante décadas foi o sonho de muitos adolescentes), sofrer tamanha modificação! É duro ver acontecer isso com uma casa que, graças ao estímulo e à tranqüilidade que dava ao seu funcionário, chegou a produzir grandes talentos para o país. Inúmeros foram os diplomatas, ministros, políticos, escritores, atletas e artistas gerados por uma banco que, hoje em dia, movido por uma competição capitalista selvagem, parece visar apenas o lucro...

Obs.: crônica extraída do livro “A Ponte” que o autor publicou em 2007.